sábado, 12 de abril de 2008

A CHEGADA EM PORTO FELIZ EM 1826

Cheguei a Porto Feliz; atravessei lentamente a sua longa rua, montanhosa e deserta, calçada de cascalho; o sol dardejava os seus raios a prumo sobre minha cabeça. Chego enfim à casa de Francisco Álvares: sai um homem para me receber: o seu rosto de cor clara, mas descorada; os seus olhos um pouco encovados e cercados de uma tinta violeta, tinham algo rebarbativo; mas seus cabelos pretos anelados sobre uma fronte pálida, onde se lia alguma coisa, temperavam a reserva que seu olhar inspirava: era o excelente Francisco Álvares. Mal soube quem eu era, soltou uma exclamação de alegria; dei entrada numa pequena sala; as suas palavras e as suas maneiras me encheram de simpatia.
Desde este primeiro dia, tratou-me como se eu fosse da família: livros franceses, instrumentos de física, a calma perfeita que se desfruta em uma pequena cidade, e, mais do que isso a sua privança, a sua palestra variada, viva, agradavelmente mordaz, abraçando tudo; sua casa e seu jardim deitando para uma encosta rápida em cuja base corre o Tietê; a vista de uma vasta planície, onde o rio serpeia e foge para o deserto; numerosa sociedade dos bons habitantes desta cidade, toda brasileira e liberal, todos os dias, na mesa, e a toda hora, tudo isto fez de minha estada em Porto Feliz, uma era de felicidade de que raramente gozei.
Tenho saudades deste tempo; saudades de Francisco Álvares a me recitar Camões, Francisco Manuel, Bocage e outros muitos.

(Trecho do manuscrito de Hércules escrito em 1848 descrevendo sua chegada a Porto Feliz, traduzido por Estevam Leão Bourroul)

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